sexta-feira, 2 de maio de 2008

Texto do Gabriel que vai entrar no meu video ainda sem nome, ainda sem forma, mas que tá me dando muito prazer.
Tantas imagens lindas aí em baixo:

Antes da casa, veio o homem, que de súbito, quis se construir. Achou a melhor das maneiras, aquela de se destruir. Se desfazer em partes pra se organizar melhor, mais eficiente, ou não. Pensou por um tempo, para elaborar a melhor maneira de começar. Sabe que o que divide é faca, então pegou, e foi cortar.
Começou pelo pé, que alcançava melhor. Segurou firme em seus dedos, todos espremidos. Ficou com as pontas dos pés brancas e achou aquilo bonito, puro. Pensou que o melhor seria tirar o sangue, pois não queria partes molhadas, vermelhas. Pensou que isso atrapalharia os blocos de sua construção.
Lembrou da galinha que alguém comeu, e que para o molho, primeiro pendurou a galinha de cabeça para baixo para tirar o sangue. Como ele se penduraria? Olhou para a trave que corria o teto, e jogou a corda que lhe amarrava o pé por cima da trave amarrada em uma cadeira que estava em cima de trinta e três cadeiras. Quando chutou a primeira cadeira, as trinta e duas cadeiras caíram e puxaram seu pé para a trave. Ficou satisfeito. Então pegou a faca e lhe cortou o pescoço, como o da galinha, rápido e fundo.
Quando acordou e se viu branco, resignou se com o roxo que veio junto com o branco. Roxo e um pouco de preto. E verde. Mas achou aquilo puro, formal.
Começou pelo pé que alcançava melhor. Segurou firme em seus dedos, todos espremidos, mas ainda roxos, pretos, e verdes, e brancos. Cortou o primeiro pé fora, e não sentiu nada. A panturrilha foi mais rápido, e a coxa demorou mais. Pensou em separar o fêmur em duas partes, para perder mais forma, e ser mais peça. Continuou e foi cortando. Não sentia nada. Só cortava, pensando que dali sairia, pleno, construído, realizado.
Quando começou a cortar a última mão, ficou aflito, na verdade excitado. Queira poder começar a se construir logo, para poder se abrigar se conhecer, e a partir daí se formar no que quisesse, no que quisesse. Com fluidez. As possibilidades seriam infinitas, e ele nunca mais sentiria angustia, pois poderia se reagrupar sempre, rearticulando.
No fim, quando viu-se lá, partido, nem mais partido, pois não se juntava mais, Não havia mais memória do que foi um dia, era apenas coisa, não tinha mais lugar para alma, vida. Viu-se coisa. Viu-se objeto, frio, inerte, sem a possibilidade de se reagrupar, sem articulações para articular. Ficou lá, espalhado, conformado, sozinho. Lamentou-se.


Gabriel Zimbardi

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